Brics 'não veem razão para pessimismo’, diz enviado do Brasil ao FMI

  • Pablo Uchoa
  • Da BBC Brasil em Washington
Fundo Monetário Internacional
Legenda da foto, Desempenho econômico dos emergentes tem sido uma das principais discussões do fundo

Os cinco emergentes conhecidos como Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – não veem razão para pessimismo em relação ao seu desempenho econômico no futuro, segundo o enviado do ministério da Fazenda às reuniões do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, em Washington.

Apesar da vulnerabilidade econômica que veio à luz nos últimos tempos, o crescimento mundial ainda continua sendo puxado pelos emergentes, disse o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Carlos Márcio Bicalho Cozendey, que está representando o ministro Guido Mantega nas reuniões.

Ao mesmo tempo, disse Cozendey, o Brasil é um exemplo de como estas economias têm instrumentos para lidar com o que é hoje uma das mais importantes variáveis de potencial volatilidade financeira para o resto do mundo: os movimentos de capital a partir de uma redução dos estímulos monetários nos EUA.

“Esse é um aspecto que os ministros dos Brics especificamente conversaram hoje (terça-feira), considerando que não vêem justificativa para pessimismo tão grande”, disse Cozendey a jornalistas ao fim de uma jornada de reuniões na capital americana.

“Inclusive o próprio documento do Fundo reconhece que apesar de tudo, o crescimento mundial continua sendo puxado pelos países emergentes . Ao mesmo tempo, os acontecimentos da última semana mostraram que esses países têm instrumentos para lidar com isso (a volatilidade)”, ele acrescentou.

Sobre o Brasil, o secretário da Fazenda disse que “é preciso reconhecer que o cenário de mudança de política monetária nos EUA afeta o Brasil e o mundo todo, mas o Brasil está preparado e os eventos que aconteceram em agosto e setembro mostram isso”.

Cozendey se referia aos leilões de dólares do Banco Central brasileiro a fim de diminuir volatilidade no mercado do câmbio, o que, segundo ele, trouxe “previsibilidade” aos agentes financeiros.

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A discussão sobre o desempenho dos países emergentes é uma das mais relevantes neste encontro do FMI e do Banco Mundial. O presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, estimou que os emergentes têm apenas dois ou três meses para se preparar para a redução dos estímulos americanos.

As avaliações refletem os dilemas de curto e longo prazo nessas economias. No curto prazo, o FMI avalia que os emergentes estão bem equipados com mecanismos para contrabalançar a saída de capitais.

Os instrumentos do Brasil foram elogiados: o FMI destacou a taxa flutuante de câmbio, com intervenções “transparentes e temporárias” no mercado para evitar volatilidade, e a disposição da autoridade monetária brasileira para elevar juros em resposta a pressões inflacionárias (que podem advir também do câmbio desvalorizado).

Olhando para o futuro, os emergentes, incluindo o Brasil, sofrem de “gargalos de oferta” que comprometem o crescimento potencial da economia. Entre esses gargalos estão o que os analistas chamam de “custo Brasil”: problemas de infraestrutura, falta de mão-de-obra qualificada e travas para o investimento que incluem uma alta carga tributária.

Na quinta-feira, o diretor de Assuntos Internacionais do BC, Luiz Awazu Pereira da Silva, também fez menção ao “pessimismo” dos analistas com os emergentes. Sobre o Brasil, ele disse que o país está "preparado para esse período de transição" a partir da mudança na direção monetária americana.

"O Brasil se preparou para tempos de reversão dos sentimentos do mercado, através da manutenção dos seus fundamentos macroeconômicos (...), dos níveis de sua dívida, de uma inflação sob controle e também de um elemento importante que é a solidez do seu sistema financeiro", disse Silva.

Incertezas nos EUA

Em paralelo à discussão sobre a saúde dos emergentes, a outra preocupação que corre no encontro do FMI e do Banco Mundial tem a ver com as incertezas quanto a um acordo no Congresso americano para elevar o teto da dívida americana.

Carlos Márcio Cozendey disse que o tema foi discutido durante encontros do G20 – o grupo de principais países avançados e emergentes – e que pode constar do comunicado final do grupo, a ser divulgado nesta sexta-feira.

“O assunto vai ser tratado, porque é um assunto de conjuntura da importância que tem”, disse o secretário. “Eu acho muito difícil não estar (no comunicado), afinal o G20 não pode fingir que não está acontecendo nada.”

No entanto, ele ressalvou, “no momento, a aposta continua a ser de baixa probabilidade desse evento”.

Se o Congresso americano não elevar o teto da dívida, o que provavelmente desataria uma onda de efeitos sobre a economia mundial, o G20 possui mecanismos de comunicação e coordenação para que o grupo volte a ter “um papel fundamental, ao estilo do que teve em 2008”, disse o secretário.

No início da crise financeira, o G20 articulou os chamados “muros de proteção” financeira – firewalls – para socorrer países europeus em crise e reforçar o caixa do FMI. “Claro que na medida em que você reforçou o FMI, esses recursos estariam disponíveis para serem mobilizados”, disse Cozendey.

“Mas a reunião (do G20) se faz em um momento em que ficou oscilante entre os sinais positivos da economia global, que nos levaria a ficar preocupados com a agenda de crescimento do ano que vem, e a circunstância mais imediata, que ninguém quer acreditar que pode acontecer”, ele disse.

Se as incertezas quanto à dívida americana não impedirem a retomada econômica do mundo, a presidência australiana do G20 pretende impulsionar uma agenda coordenada de crescimento, que incluiria a discussão sobre investimentos de longo prazo, disse o secretário.

“É uma agenda que está passando de uma fase de diagnóstico para uma fase de ir buscando soluções”, disse Cozendey.

“O próprio Banco Mundial está discutindo como multiplicar melhor os seus recursos, como ter uma atuação coerente e persistente na área da infraestrutura, o Banco dos Brics está dentro desse contexto...”, exemplificou.

“Em termos de G20, a agenda é construir em cima dessa retomada dessa retomada global e aprofundar o tema do investimento.”