Snowden não pediu asilo em troca de informações, diz Miranda

  • João Fellet e Luis Guilherme Barrucho
  • Da BBC Brasil em Brasília e Londres
David Miranda (à esq.) e Glenn Greenwald (à dir.) - foto: Reuters
Legenda da foto, Em carta, ex-consultor da NSA diz que os EUA tentam evitar que ele colabore em investigações

Em meio à grande repercussão causada pela "Carta aberta ao povo brasileiro" do ex-consultor da NSA (Agência Nacional de Segurança) dos EUA Edward Snowden, divulgada nesta terça-feira, o brasileiro David Miranda – que mantém contato com o americano – negou que Snowden tenha proposto colaborar com as investigações sobre a espionagem americana no Brasil em troca da concessão de asilo político no país.

Em sua carta, publicada nesta terça por diversos veículos de imprensa, Snowden diz que muitos senadores brasileiros pediram sua ajuda em investigação do Congresso sobre a suposta espionagem americana contra cidadãos brasileiros.

Ele também afirma que os EUA estão limitando sua capacidade de ajudar.

Parte da imprensa afirmou que Snowden teria se comprometido a colaborar com as investigações do Congresso caso o governo brasileiro lhe concedesse asilo político.

Segundo Miranda, porém, essa interpretação está equivocada e em momento algum foi sugerida por Snowden.

Miranda, que falou por telefone à BBC Brasil, alega que a carta buscava dar uma satisfação aos congressistas e ao povo brasileiro sobre por que ele não estava colaborando mais com as investigações do Congresso.

Ainda assim, o brasileiro diz que Snowden "acredita que nosso país é justo e, por isso, ele acredita que seria um lugar bom pra morar".

Miranda é namorado do jornalista americano Glenn Greenwald, que mora no Rio e tem divulgado informações repassadas por Snowden sobre a NSA. O ex-consultor da agência hoje vive na Rússia, com um visto que expira em meados de 2014.

Greenwald, o primeiro a revelar as denúncias de Snowden, criticou reportagens publicadas na imprensa brasileira alegando que o ex-funcionário da NSA afirmou que ajudaria o governo brasileiro nas investigações caso o país lhe concedesse o asilo político permanente.

Para Greenwald, as reportagens foram "além do que a carta quis dizer". O jornalista falou com a BBC Brasil pelo Twitter.

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Em 21 de novembro, Miranda iniciou uma campanha pelo site de petições Avaaz para que o Brasil conceda asilo a Snowden. Ele diz, no entanto, que a ideia da campanha foi sua, Miranda.

"Tomei a inciativa porque acredito que ele prestou um serviço enorme à humanidade e ao Brasil e, vendo o que ele fez, não posso ficar parado", diz Miranda à BBC Brasil.

A divulgação dessas informações vazadas por Snowden gerou reações contrárias aos EUA entre governos que teriam sido espionados. A presidente Dilma Rousseff cancelou uma visita de Estado a Washington após uma reportagem revelar que sua equipe teria sido um dos alvos da NSA.

Já os EUA dizem que as informações divulgadas por Snowden comprometem a segurança dos americanos. O governo americano busca sua extradição.

Em julho, Snowden pediu asilo a uma série de países, entre os quais o Brasil. O Ministério de Relações Exteriores disse à época que não se pronunciaria sobre o pedido.

Já Bolívia, Venezuela e Nicarágua aceitaram acolhê-lo.

Nesta terça, o Itamaraty disse à BBC Brasil não ter recebido novo pedido de asilo a Snowden e que, portanto, não se pronunciaria sobre o tema.

Miranda, contudo, diz ter recebido telefonema do ministro de Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, que teria se comprometido a manifestar-se sobre o assunto ainda nesta terça-feira.

"Se o Brasil decidir fazer isso (conceder o asilo), haverá suporte da população brasileira e da população mundial também", diz Miranda.

"Com esse suporte, podemos fazer pressão no Congresso, na presidente, e talvez consigamos alguma resposta."

Para Miranda, o Brasil é "grande e forte internacionalmente" para conceder o asilo ao americano.

Carta

Na carta de Snowden, publicada inicialmente no perfil de Miranda na rede social Facebook, o ex-consultor diz ter "manifestado o desejo" de ajudar "quando de forma apropriada e legal" o governo brasileiro na investigação dos supostos abusos cometidos pela agência de segurança nacional americana contra cidadãos do país.

"Mas infelizmente o governo dos Estados Unidos vem trabalhando fortemente para limitar a minha capacidade de fazer isso - indo tão longe a ponto de forçar a aterrisagem do avião do presidente Evo Morales (da Bolívia) para me impedir de viajar à América Latina", afirmou Snowden.

"Até um país conceder asilo político permanente, o governo dos Estados Unidos continuará a interferir em minha capacidade de falar", escreveu.

Snowden disse ainda na carta que, enquanto trabalhava na NSA, testemunhou o esquema de vigilância conduzido pelo governo americano sob a alegação de que o programa de espionagem visava a "própria segurança" dos Estados Unidos.

"Eles revogaram o nosso direito à privacidade e invadiram as nossas vidas. E eles fizeram isso sem perguntar à população de nenhum país, nem mesmo a deles".

"Se o Brasil ouvir apenas uma coisa de mim, que seja isso: quando todos nós nos juntamos contra injustiças e em defesa da privacidade e dos direitos humanos básicos, nós podemos nos defender de até dos sistemas mais poderosos", concluiu ele.