Como investir no mercado financeiro... fazendo o bem

  • Elizabeth MacBride
  • Da BBC Capital
Investidor anjo. Foto: Thinkstock

Crédito, THINKSTOCK

Legenda da foto, 'Investidores anjos' usam influência e dinheiro para alavancar pequenos negócios

A origem da "segunda carreira" da jordaniana Julie Hannah no mercado financeiro está em um episódio que aconteceu quando ela tinha 7 anos.

Em 1973, sua família e ela fugiram para Beirute, no Líbano, vindos da Jordânia, para escapar da guerra. Quando conflitos eclodiram então no Líbano, eles se mudaram para os Estados Unidos.

No Estado do Alabama (sul do país), foram recebidos por comunidades que ajudavam refugiados a reconstruir suas vidas.

A experiência de depender da caridade de outras pessoas marcou a executiva, que trabalhou em empresas como Netscape e no mercado financeiro.

Há alguns anos, ela resolveu retribuir e montar uma nova carreira com esse espírito.

Hoje ela administra a Kiva, uma empresa de tecnologia sem fins lucrativos de San Francisco. Sua empresa administra "microempréstimos", em valores a partir de US$ 25 (cerca de R$ 60), para pequenos empreendedores em todo o planeta.

Hannah se dedica a um setor que surgiu nos últimos anos no mercado financeiro que prega uma filosofia de "finanças de alta compaixão".

"Nos últimos quatro, cinco anos, mais pessoas estão acreditando que este modelo pode mudar as coisas", diz Allen Taylor, vice-presidente da Endeavor Global, de Nova York - uma rede sem fins lucrativos que procura conectar empreendedores de mercados emergentes com entidades e pessoas que possuem recursos para investir.

Pequeno herói

O pequeno empreendedor é importante para a economia de diversos países - ricos e pobres. Empresas com menos de 250 empregados e menos de cinco anos de existência são responsáveis por 40% dos empregos gerados em 18 países europeus e nos Estados Unidos, segundo um estudo da OCDE.

"Empreendedores são os heróis", diz Mike Hennessey, que era executivo da Oracle e hoje investe em pequenas start-ups na América Latina.

A internet facilitou que financiador e financiado se encontrem. Hennessey está de olho em bons lucros. Ele acredita que pode ter retornos de até dez vezes do que investiu. Mas ele diz que a maior recompensa é ver empresas decolando e pessoas sendo empregadas.

Por isso ele diz ter investido na Sontra, empresa de fretes online baseada em São Paulo, que hoje emprega 14 pessoas.

Se você tem interesse em participar desse "mercado financeiro de compaixão", alguns especialistas têm dicas importantes.

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Nancy Somers, uma americana de 61 anos do Estado de Minnesota (norte dos EUA), costuma brincar: "sou uma investidora internacional". A empresária aposentada já fez milhares de empréstimos através da plataforma Kiva (ela não revela os valores totais).

Um dos empréstimos foi de US$ 25 (cerca de R$ 60) a uma livraria em Amã, na Jordânia. Quando os empréstimos são devolvidos, ela reinveste o dinheiro em outros pequenos negócios.

Cerca de 1,2 milhão de investidores já emprestaram US$ 595 milhões (R$ 1,5 bilhão) a 1,4 milhão de empreendedores pelo Kiva, que foi lançado em 2005.

Os investidores podem conhecer o perfil dos empreendedores por meio de perfis que são publicados no site. No Kiva, como o objetivo é caridade, não há juros cobrados. A própria operação do site é custeada com doações.

Para garantir mais segurança a quem empresta, o site faz um ranking em uma escala de um a cinco sobre a reputação de bom pagador dos empreendedores. O valor médio dos empréstimos é de US$ 418 (cerca de R$ 1 mil).

O índice mais impressionante do site é taxa de compromissos honrados: segundo a Kiva, 98% dos empréstimos foram devolvidos.

Para quem busca algum retorno financeiro, existe a Calvert Foundation, baseada no Estado americano de Maryland (nordeste do país). As pessoas podem investir a partir de US$ 20 (cerca de R$ 50) com retornos de 0,5% a 3% ao ano.

Em 20 anos de operação, a fundação se gaba de ter um índice de 100% de empréstimos retornados.

O banco holandês Triodos faz microempréstimos que são compilados em títulos. As taxas de retorno anuais oscilaram entre 2,8% e 4% nos últimos cinco anos.

INVESTIMENTO EM PRIVATE EQUITY

Uma série de fundos de private equity estão surgindo no mercado, permitindo o investimento em empreendedores de mercados emergentes. Private equity - que envolve investimento em empresas não listadas em bolsas de valores - costuma ser um ramo exclusivo para pessoas muito ricas ou bem-conectadas. Mas alguns desses novos fundos que estão surgindo são acessíveis a aqueles que têm pouco dinheiro ou amigos influentes.

Mas a Endeavor ressalta que esse tipo de negócio é bastante arriscado. A entidade criou um fundo de dez anos, em que investidores ganham dinheiro cada vez que uma empresa é vendida ou é aberta em alguma bolsa de ações.

Nesse momento, 80% dos lucros do negócio vão para a Endeavor (que não tem fins lucrativos e usa esse dinheiro para custear suas operações). Os demais 20% vão para o investidor - que também tem a opção de revender sua participação no fundo a terceiros.

INVESTIDOR "ANJO"

Investidores "anjos" são pessoas experientes do mercado financeiro que costumam oferecer capital, know-how e sua rede de influências a um novo empreendedor.

Em troca, ele recebe uma participação da empresa, e algum prêmio quando a empresa é vendida ou entra na bolsa de valores.

Em mercados emergentes, os investidores "anjo" têm relações pessoais próximas com empreendedores. O tamanho do investimento pode chegar a milhões de dólares.

A Angel List é uma plataforma que promove encontros entre investidores e start-ups. Os riscos nesse mercado são bastante altos. O investidor anjo pode perder todo o dinheiro que colocou em um negócio. Mas se a empresa prospera, os retornos chegam a dez vezes o investimento feito, ao longo de cinco ou dez anos. Em geral, isso acontece no momento em que uma empresa é vendida.

"A recompensa maior é ver o efeito que uma empresa bem-sucedida tem no ecossistema de negócios, quando os próprios fundadores do negócio viram investidores em outras empresas ou criam outros negócios próprios", diz Hennessey.